quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Raul Drewnick - Pais, Filhos e Outros Bichos


                                  A verdadeira historia de Erik
 
Erik Junior tem cinco anos e quem o vê revirado o chão com a pazinha no jardim de sua casa, ou enchendo de água a panela para molhar a terra não imagina o que Erick Pai pensa dele. Parece mentira, mas o garoto tranquilo, que agora vem com a Mão cheia de feijõezinhos para plantar, é descrito assim pelo pai se alguém pergunta como ele é:
O Erik? É uma praga, um capeta, uma peste. Um bandido pior que o Al Capone.
Enquanto o menino, com seu jeito de cientista, semeia os grãozinhos no solo que preparando com tanto cuidado, como se estivesse iniciando ali um grande projeto de reflorestamento, vamos tentar descobrir por que Erik Pai tem uma opinião tão severa sobre esse pequeno benfeitor da humanidade.
Para que ninguém tome uma atitude precipitada, e não vá logo supondo que o pai do garoto só pode ser um velho ranzinza e injusto, é conveniente dizer, desde já, que ele não é um velho, nem ranzinza, nem injusto.
Erik Pai tem 26 anos e é bom, alegre, algumas vezes até brincalhão.
Digo algumas vezes brincalhão e preciso reconhecer porque é verdade, que todas as vezes em que alguém o viu brincando, mas brincando mesmo, com gosto, era sempre com o Erik Júnior que ele estava.
Neste ponto os  leitores devem estar imaginando que ou o Erik Pai chama o filho de praga, capeta,peste e bandido só de brincadeira ou a historia tem alguma coisa errada. E eu garanto que o pai do menino é bom, alegre, brincalhão e gosta muito do Erik Júnior. Mas quando chama o filho de tudo aquilo é porque acha que ele é mesmo aquilo tudo.
Para começar a esclarecer o mistério, antes que os leitores se irritem, é preciso dizer que Erik Pai tem a mania de colecionar. Coleciona vasos de cristal, jarros de vidro, pratos raros e delicados, que ele vem reunindo há mais de cinco anos, ficam em exposição na sala, para que nas festinhas e reuniões os amigos possam dizer:
Isso aqui eu não me lembro de ter visto antes. Você comprou recentemente? Ah... é uma beleza.
Na ultima visita, os amigos da família notaram a falta de duas peças. Foi aí que Erik Pai explicou tudo. O Erikinho, disse ele, herdou do avô, que era agricultor, a paixão pela terra. Para ver o menino feliz, é só deixar que ele brinque no quintal. Não da trabalho nenhum. Mas dentro de casa ele se modifica, vira um estabanado. Parece que tem implicância com os objetos. Encosta aqui, esbarra ali, daí a pouco tudo esta no chão,  espatifado. Foi assim que aquele cinzeiro e aquele pratinho?..., Perguntaram os amigos. Foi assim, confirmou Erik Pai quando entra na sala, ele se transforma numa praga, num capeta numa peste, num bandido.
Esse e o drama de Erik pai. Toda vez que, no escritório se lembra de que, naquela hora a mulher pode ter se descuidado e o filho talvez esteja sozinho na sala, ele pega o telefone e liga. Como agora. Depois do quinto toque, Erik Pai já foi cercado pelo pânico. Imagina a cena:
A mulher  foi fazer alguma compra e o filho, que deve ter ficado brincando no quintal, ouviu  telefone e vai querer atender . só de pensar que neste momento ele pode ter entrado correndo na sala, onde fica o aparelho, Erik Pai tem calafrios.
-Alô.
-Alô, filho. Aqui é o papai. O papai. O que você ta fazendo?
- Oi pai. Eu...
- O que você esta fazendo?!
-Eu..
A hesitação do filho faz Erik Pai supor que sua bela coleção virou um monte de cacos. Vermelho, suado, ele insiste:
-O que você esta fazendo?!
- Oque eu estou fazendo?  Eu estou falando com você
Antes que o Erik pai alem de chamar o filho de peste, praga, capeta o chame de sínico , é melhor terminar o conto por aqui.


Características:

* Interiorização do relato;
* Evocação de estados emocionais
* Conto urbano
 

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